terça-feira, 23 de junho de 2009


MEMORIAL

Eu costumo dizer que o verdadeiro prazer pela leitura só acontece quando nós descobrimos seu verdadeiro valor. Digo isto porque foi exatamente o que aconteceu comigo. Ouço muitas pessoas dizendo que o prazer pela leitura não pode estar atrelada ao reconhecimento da necessidade. Eu concordo em parte. Falo, como disse anteriormente, a partir de minhas próprias experiências, e isto talvez não possa ser generalizado, da mesma forma como o que as pessoas disseminam a respeito do prazer idealizado pela leitura.
Divagações à parte, sinto-me profundamente triste por não trazer na memória lembranças de minha primeira infância e inicio da adolescência, no que se refere à atividade de leitura, especificamente as leituras de materiais impressos (livros, revistas entre outros). Não sei exatamente o que bloqueou as minhas lembranças.
Mas o que não se apagou de minha memória foram as boas e doces lembranças das histórias contadas por minha mãe. Histórias que acalantavam as nossas noites – ela sempre reunia os filhos menores antes de dormir - e nos contava histórias do imaginário popular, clássicos da literatura infantil e histórias do tempo de sua infância. Certamente que meu interesse por narrativas nasceu desse incentivo. Acredito também que as grandes dificuldades com as atividades de leitura foram provenientes das práticas pedagógicas escolares.
De minhas experiências com a leitura recordo a partir da 6ª série do antigo ginásio. Quando cursava esta série, já não morava com meus pais. Nesta época, morava com minha irmã mais velha, diretora de uma escola pública estadual em uma cidade do interior do Maranhão. Meu interesse pela leitura mudou radicalmente, no que se refere ao gênero textual. Na casa de minha irmã havia muitos livros didáticos, paradidáticos, enciclopédia, livros acadêmicos entre outros. Deliberadamente, passei a lê-los com o objetivo, ainda que não consciente, de buscar informações. Os textos acadêmicos eram os meus prediletos. Ali ficava sabendo, isto é, descobrindo coisas fantásticas, passei a me apropriar de conhecimentos não muito comuns para um garoto daquela idade. Lembro-me dos livros de Didática, História da Educação, Estrutura e Funcionamento do Ensino de 1º e 2º Graus, entre outros, além de inúmeras apostilas acadêmicas – nesta época minha irmã cursava sua segunda graduação, o curso de Pedagogia – livros didáticos de biologia, geografia, inglês, história e matemática, todos do 2º grau. Nesta minha fase da vida, especialmente a escolar, a única lembrança nitidamente viva era a ausência de uma biblioteca.
Todo esse universo contribuiu significativamente para a escolha de minha profissão de fé. Ao chegar ao curso de formação para o magistério, as atividades de leitura não mudaram no que diz respeito modo como eram implementadas: sempre ficava explícita a obrigatoriedade, ler para responder a uma “necessidade”, uma tarefa meramente escolar.
Apesar de ter essa lembrança não muito positiva com relação a prática de leitura, fui recompensado com o privilégio de ter bons professores, verdadeiros mestres que serviram como referencial para a minha vida profissional. Claro que não foram todos, mas recordo especialmente de quatro professores – dois de língua português, uma de alfabetização, outra de metodologia para o ensino de comunicação e expressão e minha professora de estágio supervisionado. Como o meu ensino médio foi o magistério, todas as disciplinas foram de extrema relevância, o que via na teoria era facilmente aplicável na prática. Desta época lembro-me de um texto de reflexão que muito me marcou pelas questões que abordava. Não recordo o título, mas era uma pequena história que mostrava que a alfabetização era um processo, que ninguém sabe tudo e que era muito amplo e relativo o conceito de alfabetização.
Foi exatamente no ensino superior que cheguei a conclusão de que a necessidade antecede o prazer pela leitura. Explico: foi pela necessidade de ler que veio o prazer em ler. Fiquei chocado com a postura dos professores na graduação, primeiro porque a relação professor-aluno era totalmente diferente daquela que se via na educação básica, segundo porque parecia que os professores tinham “engolido” todos os livros do curso, fazendo citações, dando referências, e aquilo para mim era fantástico. Aprendi com eles a ser um aluno autônomo, eu mesmo gerenciando minha aprendizagem. Mas isso somente ocorreu em meados do curso.Hoje, considero-me um leitor, não apenas pela quantidade, mas pela qualidade das leituras que faço constantemente. Isso tanto pelo prazer quanto pela necessidade que minha profissão impõe.

Um comentário:

  1. Antônio,
    também guardo poucas lembranças das minhas primeiras leituras, dos primeiros professores e professoras. O importante é que você se tornou um leitor voraz e um bom escritor.
    Espero que seus colegas e alunos aprendam com seu exemplo.

    Senti falta de nossa galera de São Luís no blog. rs. Fale mais de nossos encontros e dos colegas de outras cidades, ok?

    Abraços

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